sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Uma Carta

"Alberto

Sobre a tua carta recebida hoje, nada ou quase nada tenho a dizer-te. Ela nada adianta sobre as tuas e as minhas razôes. Continuas a sentir as tuas e eu as minhas... Apenas te peço tréguas a este infernal cansaço destes últimos dias. Estou fatigada. Matam-me. Nada tens a dizer-me de novo, nem eu a ti. Queres agora atirar para os meus fracos ombros a pesada responsabilidade duma separação?!Seja. Dir-te-ei apenas o que já te disse creio que duas vezes. Seguir-te-ei para onde me chamares, farei o que quiseres que eu faça. Espero. Sou tua mulher, não é verdade?Espero as tuas ordens, as tuas resoluções. Quando me não quiseres, diz. Se me quiseres, diz também. Eu só peço que me deixe em paz, ou pelo menos respirar, porque já não posso mais. Tudo quanto quiserem, mas não me enleiem mais com filosofias, com arguições e com queixas. Como te disse: espero. Eu não sei o que é a justiça, eu não sei o que é a verdade, eu não sei o que é o amor, eu não sei nada. Seja. Tu que sabes tudo, resolve, procede, simplifica. Mais discursos, não. Para quê?Valem todos o mesmo!São todos a mesma coisa!Já me dissestes tudo e eu já te disse tudo. Estou como em minha casa. Tenho um teto que me abrigue, tenho que comer. Posso perfeitamente esperar que resolvas a tua vida, a minha vida. Não tenho pressas já. Não é para mim tudo já a mesma coisa?!Teorias, mas não. Peço-te. Resolve tudo como quiseres. Tudo fica em tua mão, é tudo como quiseres. Estou cansada. Estou resignada. Já quase tudo me é indiferente. Eu espero mas, como já te disse, não discurso mas resoluções. Poupa-me a mais mágoas, que é uma obra de caridade.
Adeus.

Florbela"

Livro: "Afinado Desconcerto - (Contos, cartas, diários)"
Organização: Maria Lúcia Dal Farra
pg.179

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