quinta-feira, 30 de março de 2023

explosão

Quando eu não sou eu as violências me atacam de uma maneira tão dolorida, isso tudo por causa de uma sombra. Desde que eu nasci, eu aprendi sobre a falta, um peixe que causa pânico. Qual peixe causa pânico? Aquele com uma aparência fora do comum. Ser comum. Eu nunca me senti comum, eu nunca quis fechar as pernas, minha mãe odiava meu jeito e me dizia sempre que fui trocada na maternidade. Uma família branca, pobre, do interior de Minas... Cheia de privilégios. Minha família missigenada que não conseguiu sequer indentificar o estupro familiar. A violência dura de violarem seu corpo constantemente, dói demais, a gente se sente na inexistência. Sempre me senti inexistente. Eu não pertencia a nenhum lugar até o dia pisei no teatro. Aquele chão de taco salvou minha vida. Minha mãe me acusou de ladra e órfão. Meu pai tentou pegar nos meus seios e me ensinou, muito pequena, que as pessoas que moravam na rua eram exatamente igual a nós. Meu pai, um bolsonarista frustado fã de Raul Seixas, ele e seus amigos gays (só entre a gente que se lê, eu sempre soube que meu pai era um gay artista e q eu não poderia ser igual ele pq a frustração enrrigecia o amor, e eu, De alguma maneira.... Entendi o amor. Meu pai, um homem pardo, filho de indiginenas, bruxos [sim, no masculino, meu bisavô era um bruxo discípulo de São Cipriano] escravizados e portugueses, a clássica história é minha ancestralidade. Uma branca privilegiada, e eu sei o quanto isso me faz estar aqui agora e .
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Eu vivi, cresci e me estraçalhei questionando o que era verdade e o que era mentira. Isso sempre foi a maior questão da minha existência, pq me lembro muito pequena duvidando da existência.

quarta-feira, 29 de março de 2023

ser

Se olho pra mim com distanciamento a arte sempre foi um processo de cura da doença que é estar no mundo sem pertencer a classe privilegiada. E quando digo "classe privilegiada" exerço minha autonomia do pensamento. É uma certa classe que não percebe que ter dinheiro muda tudo. Uma classe que exerce seu poder em silêncio, e todos os proletariados fálicos de Marx, resistem na dor de serem também massacrados. Sucumbimos. É necessário repensar todos os conceitos que fundam nossa normatividade violenta e adestradora de subjetividades. Uma política fundada a partir do afeto, uma cultura que é fruto do exercício político do cuidado. 

Rever áudios do whatsapp não altera o desejo de imaginar, a ação de sentir concretamente o afeto. Vamos adoecer nossos corpos se substituirmos, em nossos sonhos, nossa imagem de carne e osso por avatares embranquecidos, pálidos, limpos e saudáveis. A normatização da saúde adoecida corroe qualquer possibilidade de invenção de existências distintas da massa. 
Precisamos resistir. Cotidianamente. Micropolítica é fundante de afeto saudável, livre e pertencente. 

vômito poético

Não sei se é exatamente o que eu queria, mas, eu encontrei o meus escapes. Estou começando a conseguir organizar no meu corpo-mente-ambiente os meus desejos espalhados sobre mim por e pelo mundo. (re) existo! E parece tão idiota dizer assim, mas quem é que não precisa vomitar verdades depois da dor?!

terça-feira, 21 de março de 2023

morrer

Você vai ao médico porque está emagrecer muito rápido.
É um câncer cabuloso e você vai morrer rapidamente, tudo vai parar, não há o que se fazer. A vida escorre em um limite muito presente. Só importa o que se vive...

Lembrei da Cecília Bizoto e daquela tragédia. A vida é breve. O amor há de renascer das cinzas

Agora.

quinta-feira, 16 de março de 2023

Desculpa mas não quero ver você partir não quero mais

Espero insistentemente que você me veja.
E lá vem ela, arrebentando essas histórias normativas de amor.
Será que existem transcendências subjetivas que se vivem somente na presença do amor de outra mulher?

Te espiando de longe, é melhor não esperar tanto, ou foi, ou já é.
Quanta insensatez meu bem, pra que? 

coisas de artista fracassado

Eu fui tão maltratada na vida que me pergunto todos os dias no que é que estou fazendo aqui. Deve haver um propósito, não faz sentido. Eu nunca recebi da vida essas coisas boas da infância, eu fui espancada, estuprada, violentada de formas tão toscas e bizarras. Parece até um filme, acho qque foi isso que me fez apaixonar pelo teatro, pelas artes, pela poesia. Existia nessa informalidade um modo de ser que fazia esquecer do real, me fazia recriar narrativas autoficcionais tão pontentes, potentes no empurrão da vida, no desejo de botar existir. A arte me fazia esquecer todas as memórias de violência, mentira, não é esquecer, é transcender! Eu rodava, gritava, enfiava a cabeça no vaso, pisava em caco e representava se um jeito tão sincero que até eu ficava assustada com tanta energia. É a dor que faz isso, eu sei. E eu não dei conta da dor, não dei conta de viver desse jeito, sucumbi.

segunda-feira, 13 de março de 2023

silêncio

Aprender a ler o silêncio, aprender sobre o desejo ausente que transborda insuficiências cardíacas. Aprender sobre si todos os dias e deixar ir feito rio que segue o fluxo. Autocuidado e afeto, é só o que nos resta e tudo que a gente precisa .

domingo, 12 de março de 2023

mulheres

Tenho 36 anos, e morri três vezes na vida, que eu saiba e ainda me lembre.  A primeira quando me mudei pra BH, a segunda quando vivi o primeiro abuso emocional e a terceira foi agora, parece que em instantes o mundo desaba. Rápido como um raio, lá estava eu de novo em mais um relacionamento abusivo, qual o próximo? É difícil aprender, é difícil impor limites. Lá se vai quase um ano dessa terceira morte, e eu renasci infinita, e quase me esqueço de mim na partilha de um sexo gostoso. É difícil manter o prumo. Me dividi ao meio e todos os dias que me olho no espelho lembro disso, aquela Dayane que se deixava vitimar de abusos afetivos, não existe mais. Porém, ela tá aqui, espreitando minha vontade de amor. É gostoso e solitário ao mesmo tempo. É de doer a espinha, um redemoinho dentro e fora do meu útero ainda ferido. Aquela imagem não tarde em refletir tanto sangue, tanta dor e tanta vontade de morrer ali. Pois bem, estou viva! Desejando fazer da poesia um cuidado performativo, espero dessa forma matar a morte de vez. Essas mortes estando viva são de muita violência, difícil de esquecer e simplesmente seguir. Mulheres se arranham e continuam, o mundo adora chutar nossos pés descanços, e o sangue retorna, outra vez. Esses arranhões não cicatrizam e a gente aprende a conviver com a imagem do sangue e da violência, mesmo que pareça um pesadelo, aprendemos a seguir.