segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Brinco de princesa (M), Arruda (I), àrvore da felicidade (P), Alecrim (O-S), Léia (R), Lavanda (C), Pitanga (E), Lírio (M-A), Samambaia (M), Cidreira (J)

Acordo e coloco Chopin (complete nocturnes) bem alto no fone de ouvido. Um café quente e um pedaço de broa. Enquanto o cigarro queima no cinzeiro penso sobre o quanto os homens são egoístas. Penso também que as mulheres foram ensinadas a ficarem em silêncio pela superioridade de compreensão que elas carregam. Os homens não suportam no corpo o entendimento de certos assuntos. Eles ressoam falácias medievais e vomitam regras obsoletas. As mulheres sentem no corpo e só depois tentam compreender. É claro que não se pode generalizar, existem mulheres com ares masculinos e homens com aspectos femininos, de ambos eu digo da existência (alma, energia, também não sei o nome dessas subjetividades), o resto não me interessa. O cigarro termina em cinzas, o cinzeiro verde deixa rastros da noite passada, dois cigarros de filtro vermelho e três de filtro branco. Excessivamente intensa corro mais uma vez aqueles velhos riscos. As 2 da madrugada, depois de bater o portão, deitei e chorei um pouco. Sem o desespero dos anos perdidos dentro daquele trauma, mas ainda com o corpo doendo do abuso. Foi ai que eu me lembrei de Ituiutaba, da violência sofrida na infância, do ódio espalhado dentro do meu medo do mundo. Quando a criança é estuprada, violentada, espancada e abandonada não se pode esperar com muita previsão absolutamente nada, as incertezas são seus limites. Vez ou outra aparecem pássaros no meu quintal, no final da tarde o laranja do por-do-sol deixa as plantas com ares de magia. Hoje, quando me recordo das violências que sofri, sinto feito as plantas do meu jardim.... um por-do-sol com ares de magia. Um findar da tarde, dos medos, das ansiedades, e um sol que queima a pele com o tempo, deixando a alma com ares de magia. Ja odiei durante muitos anos, todos os dias, aquela velha que teimava em bater com a minha cabeça na parede, de uns tempos pra cá o ódio se tornou como um perdão diário. O mesmo digo do homem que me fazia chupa-lo, aos cinco ou seis anos, ja não sei ao certo. O mesmo digo dos meus pais que me abandonaram, o mesmo daqueles tantos outros homens que teimavam em me fazer mal enquanto eu me distraía na adolescência raivosa.   Sinto por todos eles um perdão diário, um desejo absoluto de que eles se perdoem, porque não deve existir nada mais dolorido do que não se perdoar. Enquanto acendo outro cigarro e reabasteço a xícara de café penso em quem eu me tornei. "Mulata não das raças, mas de existências". Não deixo mais que me aconteçam coisas tão dolorosas. Não permito mais que me arranquem o amor que tenho. Não me permito mais doer em silêncio. Meu corpo, minhas regras. Pego um biscoito desses amanteigados, acendo outro cigarro e observo. Me sinto uma privilegiada, alguém que, não se sabe como, nem quando, nem de que jeito, conseguiu estancar o jorro, o choro, o medo. Os nomes das minhas plantas são os nomes das pessoas pelas quais senti desafetos, cuidando de cada vaso eu cuido um pouco de cada dor.

Nenhum comentário:

Postar um comentário