terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Nasci!

Pedaços no meio de tudo. Algumas flores espalhadas pelo caminho, meus pés enlameados de pétalas secas. Cresci, e como tudo de novo que entra na vida, crescer dói. Não que eu esperasse crescer assim, a base de socos e manteiga quente deformando a cara. Não! Mas cresci. E quando se cresce o mundo parece outro, temos de recomeçar, mudar os hábitos. Acordar e escorvar os dentes com os dedos, dois copos de água antes da primeira refeição, creme na pele, óleo nos dedos, aguar as plantas, tomar 10 minutos de sol e verificar como andam as formigas da parte de fora da casa. Colocar o lixo na calçada, limpar a pia, fazer café, fumar um cigarro, escrever um pouco, estudar, trabalhar, andar na rua sem destino nenhum simplesmente pelo prazer do cansaço. Voltar, beber chá, estudar mais um pouco, fazer algumas bolsas, cuidar do amigo, ver o céu que cobre a noite, rezar, dormir e sonhar. Na parte esquerda do meu quarto tem uma bíblia, algumas velas e a imagem de São Jorge me mostrando que a fé faz parte dessa nova fase. Nem sempre acredito, mas na maioria das vezes é isso que me salva. Meu corpo também mudou um pouco, pés maiores e coluna doendo. A bacia transborda em formosura mal feita, e os seios se derretem com o passar dos anos. Olheiras e dentes amarelos de cigarro. Meus cabelos cobrem os ombros e se escurecem com o envelhecer dos fios. Minha mão carrega milhares de outras mãos, pesando com o passar dos dias, minhas unhas vermelhas escondem os cortes provocados pela dor do abandono.  E assim, quando me deparo nua em frente ao espelho velho, que ganhei em uma vidraçaria qualquer, me assusto, mas gosto do que vejo. Meu corpo carregando as marcas do que vivi. Um corpo marcado ilustrando o crescimento que vejo nascer, um novo corpo, uma cara velha, uma alma recém construída em partes, recém apartada em outras, eu. Na parte de dentro o sangue corre apertado, uma felicidade ainda sem nome movimenta a engrenagem e lubrifica os nervos. Uma pulsão desconhecida me impulsiona a continuar, a acreditar. Cresci sem saber pra onde, envelheci uns anos enquanto se passaram dois, amadureci como os abacates da minha avó, enfiados na lata de arroz. Sinto-me como nunca, me vejo e me quero, dói, mas sinto. Crescer faz parte de tudo, raízes se aprofundam para baixo, e nessa nova estação os galhos antes secos, ganham brotos de novos frutos, cores intensas rasgam os olhos que utilizei para identifica-los, não importa, na cegueira vejo aquilo que antes me matava, e transformo em energia vital pra esse novo corpo e essa nova alma que me habitam. Meu Deus, nasci!

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